Edward Magro | 11/09/2025
Acaba de ser decretado: 27 anos e 3 meses de cadeia para o criminoso Jair Messias Bolsonaro.
Eu me pergunto: foi pouco?
Eu me respondo: sim, foi.
Foi muito pouco.
Eu me consolo. Já é um começo. Um começo que traz a vingança discreta da realidade: o homem que se acreditava inimputável, o mito erguido sobre lama, ódio e ressentimento, agora habita o território dos réus condenados. A sentença não devolve o que foi arrancado, mas concede à história um gesto inaugural.
C’est la porte qui mène au châtiment, como dizem os franceses.
Porque 27 anos e 3 meses não devolvem os 700 mil mortos do genocídio sanitário conduzido por quem preferiu sarcasmo à ciência; por quem incentivou aglomeração ao isolamento; por quem distribuía cloroquina em vez de vacinas.
Não devolvem o pulmão farto de ar a quem partiu em respiração agônica, sozinho em hospitais saturados.
Não devolvem o último aperto de mão, nem o abraço, nem o beijo final que se perdeu. Não devolvem a despedida vetada.
Não devolvem o luto que ficou suspenso no ar, fechado no caixão lacrado, sem féretro, sem cerimônia de adeus.
A pena é curta demais para abarcar a dor dos que não puderam dizer adeus aos seus. Curta demais para aliviar o peso das valas comuns — fendas abertas na terra onde o pranto nunca encontrou repouso. Pranto que se perpetua como ausência dolorida, que segue presente sem nunca se despedir.
E 27 anos e 3 meses não são suficientes para resgatar do tormento psíquico os milhões de malucos — uso aqui a palavra do próprio condenado.
Milhões que, alimentados diariamente por fakenews, tiveram as almas sequestradas pelo gabinete bolsonarista do ódio.
A sentença não devolve sanidade. Não devolve senso de realidade. Não devolve liberdade interior. Tampouco cura a servidão voluntária. Serão bovinamente, gados eternos, tangidos sem pensamento próprio no rebanho do ódio.
27 anos e 3 meses não devolvem ao país a paz coletiva que foi triturada em nome de uma guerra cultural siderada, alucinada em grau máximo.
A violência discursiva, convertida em norma, abriu fossos intransponíveis entre vizinhos, amigos, famílias inteiras.
Não há quem não tenha perdido um amado para a insanidade bolsonarista.
E não há calendário judiciário que restitua a delicadeza das relações comunitárias, furtadas por essa pedagogia do rancor.
27 anos e 3 meses não devolvem à imunda boca criminosa do criminoso o voto imundo. Repugnante. Repulsivo. Maldito em todos os sentidos.
O voto que o criminoso criminosamente bostejou na votação do golpe contra Dilma.
27 anos e 3 meses não devolvem à imunda boca criminosa do criminoso os milhares de insultos, ofensas, grosserias e quetais.
Palavras que, durante décadas de vida pública, o condenado cultivou como quem semeia mancenilheira, árvore venenosa que mata ao toque, pelos caminhos por onde passa. Sempre rasteiro. Sempre ruidoso. Sempre venenoso.
Sim: 27 anos e 3 meses é pouco.
É muito pouco.
Muitíssimo pouco.
Mas 27 anos e 3 meses é também motivo de júbilo. De celebração. De alegria extrema.
Alegria que inunda a alma de serenidade e paz. Alegria que transborda em prazer e gozo.
Alegria que me faz lembrar que outros delitos serão investigados.
O crime continuado das rachadinhas, praticado com devoção por décadas, desviou milhões dos cofres públicos.
O roubo e a venda das joias do acervo presidencial.
Os 44 milhões que brotaram misteriosamente em sua conta bancária em apenas dois anos.
A carteira imobiliária montada em dinheiro vivo — uma fortuna que faria corar de inveja qualquer incorporador imobiliário profissional.
A lista de delitos a serem investigados é longa. Cada item dela carrega a promessa de novos tribunais. Muitos outros delitos serão investigados. E, certamente, outras penas virão.
É nesse horizonte que a sentença de 27 anos e 3 meses ganha densidade. Não como fim, mas como abertura.
Sim, 27 anos e 3 meses é pouco. Mas é o pouco que abriu a porteira. A porteira que permitirá muitos outros anos de Papuda.
O pouco que inaugura o muito.
O pouco que desmascara o criminoso mais criminoso da história política do Brasil.
Resta apenas desejar que a pena lhe seja pesada. Pesada como a memória dos mortos.
E que a cadeia lhe seja longa e não lhe seja leve.
